Há quase um mês, dia 2 de julho, um ataque cardíaco matou o escritor carioca Rodrigo de Souza Leão, aos 43 anos. Ele estava internado numa clínica psiquiátrica há vários dias, a seu próprio pedido: sua esquizofrenia, detectada 20 anos antes, estava levando-o a surtos mais fortes, com os quais não conseguia lidar direito. Mesmo doente há tanto tempo, Rodrigo teve fôlego suficiente para escrever um elogiado romance, "Todos os cachorros são azuis" (7Letras), um dos finalistas do prestigiado Prêmio Portugal Telecom deste ano.O Prosa publica, nesta edição, trechos de um romance inédito que Rodrigo deixou pronto, e que mostram a potência das palavras de quem transita na fronteira porosa entre delírio e realidade. O poeta Ramon Mello, que está adaptando para o teatro "Todos os cachorros são azuis", escreve sobre a literatura do amigo. Dois artigos também comentam a arte nascida em mundos irreais. No primeiro, o editor Sergio Cohn, que publicou poemas de Stela do Patrocínio, interna do mesmo hospital psiquiátrico que abrigou Arthur Bispo do Rosário, lembra que o termo "loucura não pode eclipsar literatura". No segundo, a pesquisadora Luciana Hidalgo, autora de um livro sobre Bispo e outro sobre Lima Barreto - também internado duas vezes num hospício - diz que é impossível fazer o elogio da loucura, mas que é inevitável pensar que "a arte se beneficia, e muito, dessa dança por contornos extremos." Ainda no caderno uma entrevista com Luiz Carlos Mello, diretor do Museu de Imagens do Inconsciente, criado pela psquiatra Nise da Silveira, personagem admirada por Rodrigo. Mello falou com Miguel Conde do seu recém-concluído livro sobre a vida e o trabalho da psiquiatra - cujos dez anos de morte serão completados dia 30 de outubro -, uma pioneira que mostrou como a criação artística ordena as emoções dos pacientes e dissipa preconceitos da sociedade.
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